quarta-feira, 7 de março de 2012

Violência e Paz


EDUCAÇÃO PARA A PAZ
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Pitágoras já dizia, há 2.500 anos: "Eduquem as crianças de hoje e não será preciso castigar os homens de amanhã." Porém, a ação de educar não se vingou, a partir de Pitágoras, até hoje. No nosso mundo atual, pseudo-evoluído, as preocupações econômicas e financeiras absorveram completamente os 3% de inteligência da raça humana, tanto dos que governam o país quanto dos que são governados. Na escola convencional de qualquer grau só se trata da instrução e da adestração. Esqueceu-se por completo da Maiêutica Socrática, geratriz da verdadeira educação.  
Uma verdadeira educação deve-se fazer presente na escola, em todos os momentos, principalmente no ensino fundamental, que é o alicerce formativo; esta deve ser completamente desarticulada da questão econômica e voltada para os valores éticos .
Quem forma o caráter de um indivíduo que, por sua vez, vai compor a sociedade, é a educação que ele recebe quando ainda é criança ou jovem. O destino das criaturas humanas que compõem a sociedade está em conexão com os princípios educacionais que lhes foram inculcados na infância e na adolescência. Daí, pode-se dizer que a horrorosa violência, que ronda os quatro cantos do mundo, possui suas raízes no fracasso dos sistemas educacionais. A famigerada violência, crescente em suas múltiplas formas, nos dias de hoje, está estritamente relacionada à inegável falta da educação, no sentido real da palavra.
Como o povo, tanto o rico como o pobre, não auto-educou-se, ao longo da existência humana, hoje a sociedade é um caos. Segurança, na atualidade, é questão de vida ou de morte. Porque a violência atinge a todas as pessoas de qualquer nível social. Ninguém é feliz, ninguém tem paz! O desespero e o medo atingem a todos. Pois, ninguém tem tranqüilidade nas ruas, em casa, nos campos de futebol, nas praças de esportes, no aglomerados de pessoas, nos templos, nos carros, nos ônibus, nos aviões, dentro ou fora da cidade.... Todo mundo vive desassossegado, de dia e de noite, a qualquer hora. É uma situação caótica, deplorável, a que chegou o ser humano !
A violência representou o fracasso da sociedade em seu processo de humanização. Esta violência criou um quadro imbatível, imprevisível e absurdo, com os assaltos a bancos, à residências e a estabelecimentos comerciais; como se verificam freqüentemente nos dias de hoje no meio social, o que por si só comprovam a veracidade dos fatos. A população vive atemorizada com os assaltos às pessoas, nas cidades e nos campo, como mostra os noticiários de violência de todo tipo, agressões e crimes, que já tomam a maior parte da televisão, do rádio, dos jornais, das revistas, etc.
A raça humana tornou-se vítima de si mesma e está num beco sem saída! Ao sair à noite pelas ruas, à pé, é agir imprudentemente; pois é grande a possibilidade de ser assaltado aí. Ficar em casa também corre o mesmo risco. As estatísticas dos crimes contra a ecologia, contra às pessoas, o vandalismo, o bandidismo, a corrupção, a sodomia, a depravação e a degeneração humana, crescem assustadoramente todos os dias. Isto está nos noticiários, nas páginas dos jornais e é do conhecimento de todos. É a realidade atual do nosso COSMOS que virou CAOS.
As medidas que os governos vem adotando não têm conseguido resolver os problemas e nem remediá-los. Porque qualquer solução, do processo de violência crescente, passa pela transformação da sociedade através da educação. Mas, como não há educação para transformar a massa social, a questão da violência fica insolúvel.
Jogamos a culpa nos políticos, nos governos, pela violência descomedida; mas quem é o governo? Nada mais é do que o expoente que sai de uma base (a sociedade). Se a base é suja, é corrupta, é violenta, etc., produz, conseqüentemente, expoentes sujos. Se não há transformação, através da educação da base, o expoente sai sujo e deplorável, ainda que sua aparência externa seja revestida de uma pseudo-beleza.
Como transformar base suja em expoentes limpos, se esqueceu-se completamente do papel da educação? Expoente, não transformado pelo filtro da educação, reproduz com fidelidade a base impura. Se não se coloca a escola como filtro transformador de bases sujas em expoentes limpos, a superação da violência múltipla, dessa verdadeira calamidade pública, que tanto infelicita os países, não encontrará solução no nosso mundo.
Uma educação eficaz certamente seria uma grande força para transformação das bases sujas em expoentes limpos e imaculados; o que resultaria na diminuição da violência. É irrefutável que a prática da educação para a modificação do caráter do cidadão, propicia-lhe insumos para uma vida equilibrada na sociedade. Uma educação verdadeiramente formativa, transforma bases sujas em expoentes limpos. Da mesma maneira que se formam os políticos, se formam os médicos, os dentistas, os engenheiros, etc.
O sistema escolar convencional que ai está é um fracasso total, enquanto agente transformador da massa social; porque este só ousa instruir, adestrar, segundo o modelo econômico vigente, para as coisas materiais, o que é muito pouco no caminho da transformação. Porque é preciso educar os jovens, inculcando-lhes princípios morais e éticos, norteadores de suas vidas; dirigindo-os para o espírito de cooperação mútua, ao invés da competição egocêntrica que lhes é imposta pelo sistema escolar adestrativo.
A violência, a indisciplina e a desordem caótica, são frutos da sub-educação, da permissividade dos pais, da despersonalização da culpabilidade, etc. Os pais e a escola, ausentes, têm produzido cidadãos delinqüentes; uma legião de seres desajustados, esquizofrênicos, irresponsáveis, etc. É preciso que os governos e a sociedade em geral acredite no que Pitágoras disse há cerca de 2.000 anos a respeito da educação: "Educar as crianças de hoje, para não ser preciso castigar os homens de amanhã." Porque os jovens não nascem delinqüentes. Os germes da delinqüência, que residem em sua psique, ao invés de serem germinados por falta de educação, como geralmente ocorre, podem ser transformados pelo filtro da mesma. Porque todos são educáveis, sem distinção de raça, sexo, cor, classe social e de faixa etária. Basta, para que isso ocorra, que haja priorização da educação, como meio de elevação dos parâmetros éticos do ente social. Tratem-se de fazer a educação na escola, nos meios de comunicação, nos sindicatos, na família, etc., que os resultados serão altamente positivos.
Nunca se viu tanta violência, urbana e no campo, no Brasil e em outros países, o que se tem constituído em verdadeira guerras civis disfarçadas. Isto é o resultado da ausência de educação para formação moral, espiritual e ética do ente humano. Desta maneira este não logrou avançar na escala de valores da seidade interna; o que se agravou com a falta da noção de cidadania, espelhada na repetência e na evasão escolar, no fracasso escolar, no desemprego maciço, nos salários irrisórios, etc.; frutos da injustiça social, propiciados pelo monstro do capitalismo. Para dar fim a este estado de coisas, é preciso investimento no social, na criança, no homem, educando-os, formando-os com valores morais, espirituais e éticos. A experiência demonstra que investir no cidadão, na criança, é o melhor caminho para se controlar a violência. Então, é preciso que a sociedade comunitária e o governo como um todo trabalhem conjuntamente, para combater as drogas, vetor da violência, para reduzir a miséria, para retirar os sem-nada da rua e dá-los abrigo e assistência condizentes com a dignidade do ente humano.
É necessário montar um sistema embasado nos valores educacionais; onde o aluno deve ser levado a conhecer a verdade, acerca de todas as coisas e de si mesmo. Então, a escola deve informar ao aluno que a violência tem origem no ego; que este quem engendrou o modelo econômico que ai está, para propiciar uma distribuição injusta de renda. Ego, que por sua vez, dá origem à miséria, ao desemprego, à favelação dos sem-nada e à violência em geral. Também deve ser ensinado que, por outro lado, o modelo econômico vigente, na forma de capitalismo voraz, na sua etapa apocalíptica, e que é o grande responsável pelo desequilíbrio social, tem sua origem na hipertrofiação do ego.
Portanto, se desintegrarmos este ente gerador de defeitos, por meio de uma didática concreta, que nos ensine o caminho da revolução da consciência, a transformação do homem será um evento certo; que por sua vez demandará a transformação da sociedade e do modelo econômico desumano que ai está ,etc. Então, a miséria, a injustiça social, a violência, etc., serão erradicadas, como conseqüência direta da transformação da humanidade. Desta forma, estaremos combatendo estes males, vetores da violência generalizada, onde eles nascem, nas causas, ao erradicar do interior de cada estudante os eus da ambição descomedida.
Esta mudança é radical e representa a última esperança para o homem telúrico. Por este motivo ,a educação genuína do ente humano não poderá estar atrelada ao modelo econômico. Não se pode fazer um projeto de educação do ente humano, atrelado ao modelo, como se fez até hoje. Temos que conectar a educação do homem a valores virtuosos da essência: éticos, espirituais, morais, etc. Porque se o educando permear-se destes valores, a transformação da sociedade estará garantida; pois que este é o meio mais eficaz de se combater a violência generalizada, na causa. Mas, do combate da violência no efeito, sem a transformação da sociedade pelo filtro escolar que transforme defeitos em virtudes, nada resultará.
Porém, se o ente humano for transformado pelo filtro da educação, dialeticamente à luz da ética, se tornará em uma poderosa força motriz agente de todas as outras transformações que virão em decorrência.
Considera-se como educação para erradicação da violência, aquela que se veicula ao estudante para o alongamento de sua inteligência, para ampliar a sua compreensão e revolucionar a sua consciência; levando-o a conhecer-se a si mesmo, por intermédio de técnica da auto-observação; prática que permite-lhe visualizar os elementos psicológicos atuando na construção dos defeitos e da violência generalizada, o que tanto infelicita os povos da nossa sociedade. Os sistemas de ensino, ao elaborarem os seus projeto educacionais, devem ter como objetivo o sucesso do homem, da escola e da sociedade. E nenhum sucesso econômico, tecnológico, material. etc., compensa o fracasso da massa social, aqui no Planeta terra. E, todos nós sabemos que este fracasso vem na forma de globalização econômica, destruição familiar, desemprego, trabalho infantil, fome, injusta distribuição de renda, ausência de política concreta de reforma agrária, imoralidade generalizada, perdas de parâmetros éticos da sociedade, mortalidade infantil, epidemias, discriminação social e racial, torturas, guerras entre os povos, agressividade, drogas nas escolas , pichação, depredação escolar, criminalidade exacerbada e violência geral; coisas que exterminam a raça humana e põem fim à espécie Homo sapiens, no Planeta Terra.
É preciso levar em conta, ao planejar o ensino, a perda de parâmetros éticos do ente social, em quase todos os setores da vida. Nossa sociedade evolucionou tecnologicamente, sem que houvesse expansão da sua consciência. Daí perdeu-se os referenciais éticos, na família, nos aglomerados sociais, na política, na televisão, no rádio, na dança, na música, na Internet, nos esportes, nas escolas, no comércio, nos serviços públicos, etc. Devido ao hipertrofiamento do ego, levar vantagem em tudo é a lei do homem atual, torpe e egoísta em sua totalidade.

Fonte: http://www.evirt.com.br/desafio/cap14.htm

Concepção Freriana de Educação para a Paz


Educação para a paz segundo Paulo Freire

Education for Peace in Paulo Freire’ perspective


ANA MARIA ARAÚJO FREIRE (NITA)


RESUMO


Ana Maria Araújo Freire, com o artigo A educação para a paz, segundo Paulo Freire, quer mostrar que, para este educador, a paz está intrinsecamente associada aos processos de transformação social pelos quais se torna possível superar a violência, instaurar a justiça, promover a igualdade e o respeito à dignidade da pessoa humana como condição para a paz. Não existe paz sem educação para a paz e sua implicação de ordem ética com justiça e realização pessoal e social.

Palavras- chave: Educação para a paz; justiça social; superação da violência.


ABSTRACT

Ana Maria Araújo Freire, with the article Peace Education in Paulo Freire’ s perspec-tive, wants to show that, for this educator, peace is intrisencally associated with the processes of social transformation through which is possible to overcome violence, institute justice, promove equality and respect to human dignity as a condition for peace. There is no peace without peace education and its ethical implication.


Key-words: Peace education; social justice; overcoming violence.



INTRODUÇÃO


PAULO FREIRE afirmou nos fins dos anos 90, que em algumas circunstâncias, poderia, inclusive, a violência entrar na cena política para estabelecer o equilíbrio das sociedades em processo de transformação necessária à instauração da Paz interna. Disse isso em seu livro falado, com visível constrangimento, reafirmando sua posição anterior de superação da violência:


... Eu já tinha dito que o ideal é que as transformações radicais da sociedade - que trabalham no sentido da superação da violência - fossem feitas sem violência (...) diante do problema da violência e da democracia, eu hoje continuo pensando que a democracia não significa o desaparecimento absoluto do direito de violên-cia de quem está sendo proibido de sobreviver. E que o esforço de sobreviver às vezes ultrapassa o diálogo. Para quem está proibido de sobreviver, às vezes, a ú-nica porta é a da briga mesmo. Então eu concluiria lhe dizendo: eu faço tudo para que o gasto humano seja menor, como político e como educador. Entendo, porém, o gasto maior. Se você me perguntar: ‘entre os dois, para onde você marcha?’ Eu marcho para a diminuição do gasto humano, das vidas, por exemplo, mas entendo que elas também possam ser gastas, na medida em que você pretenda manter a vida. O próprio esforço de preservação da vida leva à perda de algumas vidas, às vezes, o que é doloroso.


Paulo admitiu a violência como uma etapa transitória, dolorosa e necessária, e o fez em nome da democracia e da justiça social, certo de que “a democracia não significa o desaparecimento absoluto do direito de violência de quem está sendo proibido de sobreviver”. Não podemos esquecer, que ele foi um homem que se compadeceu com radical solidariedade e cumplicidade com os explorados, os oprimidos e os esfarrapados, não só de seu país, mas de todo o mundo. Assim, a possibilidade da violência parte de princípios diferentes dos que partem os das guerras.

Em última instância, a posição de Paulo foi preponderante a de quem lutou pela harmonia entre os sujeitos históricos, e, pela solução dos conflitos, objetiva e prioritariamente, pelo diálogo amoroso.

Podemos constatar esta minha afirmação em sua postura pessoal transcrita em sua obra diante de sua coerência entre sentir, observar, pensar, respeitar o outro/a. De dizer a sua palavra.
Não foi por acaso nem por motivos outros, que Paulo foi indicado para o Prê-mio Nobel da Paz, em 1993. Foi por esta sua postura de coerência impregnada de generosidade, mansidão e respeito diante das diferenças étnicas, religiosas, políticas; por sua tolerância autêntica diante das diversidades de posturas e leituras de mundo culturais dos homens e mulheres no mundo; por seu comportamento de cuidado ético com as vidas; por sua luta incessante pela Paz através da sua compreensão de educação para a autonomia e libertação.
Por tudo isso foi contemplado com o “Prêmio UNESCO da Educação para a Paz”. Na ocasião, afirmou com convicção em seu pequeno discurso, em Paris, em setembro de 1986:

De anônimas gentes, sofridas gentes, exploradas gentes aprendi sobretudo que a Paz é fundamental, indispensável, mas que a Paz implica lutar por ela. A Paz se cria, se constrói na e pela superação de realidades sociais perversas. A Paz se cria, se constrói na construção incessante da justiça social. Por isso, não creio em nenhum esforço chamado de educação para a Paz que, em lugar de desvelar o mundo das injustiças o torna opaco e tenta miopizar as suas vítimas.


Neste parágrafo tão simples quanto profundo Paulo diz de seu entendimento de Paz. Diz de sua compreensão de Paz que se antagoniza com as injustiças e tem como seu par antagônico a GUERRA. Diz se sua atitude ética que prioriza os homens e as mulheres no lugar da ética do mercado. Diz de sua perene preocupação com a formação dos homens e das mulheres numa educação, que tenha uma relação direta e dialética com a Paz. Diz de nossa responsabilidade e dever de tentar assegurar a Paz mundial e a Paz social em nossos países em torno do mundo.


Seu discurso na UNESCO é um gesto de amor, de respeito e de fé nos homens e mulheres. É o discurso de quem acreditou e alimentou os princípios da Ética da Vida. Assim, nesse seu discurso Paulo diz, sobretudo de sua crença na educação e nos seres humanos, que deve começar pela conscientização dos problemas que, nós mesmos, antieticamente instalamos na convivência social.

Diz a sua palavra com a ternura, a mansidão e a generosidade que caracterizaram sua presença pedagógica e ética no mundo. Com seu mais autêntico humanismo.eanos devemos nos perguntar para irmos ao âmago da questão, para irmos às raízes desses fenômenos da guerra e da Paz, para aprofundarmos nossas reflexões críticas, para entendermos o comportamento humano, cujas respostas, se estamos interessados num mundo melhor, penso, poderiam tomar esse caminho:

a) Que significado tem hoje a Paz? E a guerra?

Ao contrário da guerra, a PAZ nos assegura, mesmo que fugaz e transitoriamente, momentos de bem estar; de nossa esperança ontológica própria do seres humanos - “adormecida” na desesperança - voltar-se para um futuro melhor; uma ruidosa alegria, que nos mobiliza para a fraternidade e busca da felicidade - esse o destino dos humanos, mas contraditoriamente negado pela antieticidade diante da natureza e do caráter contraditório dos humanos. A Paz que tem a avidez pelo sossego e cuidado com o humano e o planeta que nos abriga. As guerras definem as diferenças injustas de riqueza e pobreza. São pré-concebidas e planejadas pela racionalidade reacionária. Os promotores das guerras se valem do medo e das fragilidades humanas e impõem o terror, o pavor e a tortura. As guerras se instauram no reino da crueldade, e são a mais verdadeira expressão da barbárie! A guerra é necrófila, vermelha como o sangue. É intolerante. Cria a desesperança.
A Guerra é plural por vocação, quer atingir e ceifar vidas em nome da morte dos adversários. Tem como intenção maior destruir o outro e a outra, e o mundo concreto construído pelas culturas sociais mais diversas através de milênios. Nega por sua natureza e essência, inclusive, a propagada ideológica da globalização da economia e do neoliberalismo: a igualdade entre os povos e as nações.
A Paz que propicia a democracia e se gera na vigência da democracia verdadeira, é congraçamento, é comemoração, é ressurreição.
A Paz é singular por natureza, atinge o mais autêntico e mais radical do ser humano, para concretizar o Ser-Mais, como queria Paulo, e por isso lutou toda a sua vida. A Paz nos faz rir e sentirmo-nos mais 

gente. A Paz vem embrenhada da capacidade de dar vivência à vida democrática, socialmente a ser vivida por todos e todas sob a égide da tolerância. A Paz tem como objetivo a existência plena dos seres em geral, e mais especialmente dos seres humanos, mesmo com seus sentimentos e ações contraditórias, nutridas em nós, humanos, pelos nossos mais ancestrais traços de agressividade puramente animal. É branca como a tranqüilidade, é biófila. É a expressão maior da tolerância, da colaboração da cumplicidade entre os seres vivos, daqueles que querem viver melhor.
A GUERRA, qualquer que seja ela, atômica, bacteriológica ou armamentista, sem dúvida alguma, instaura o reino das dores, dos dissabores, das crueldades, das injustiças. Nasce dos desejos desenfreados de poder e de imperialismo. Do vilipendiamento das virtudes humanas. Estabelece a separação entre o corpo e a alma. É o retrato da violência extrema e das mortes! Da desumanização da vida dos homens e das mulheres!


b) As Guerras são inexoráveis? Por que fazemos as Guerras?

Não. As guerras não são inexoráveis. Mas para elas não existirem, precisamos saber, conscientizarmo-nos de “que a Paz é fundamental, indispensável, mas que a Paz implica lutar por ela. A Paz se cria, se constrói na e pela superação de realidades sociais perversas. A Paz se cria, se constrói na construção incessante da justiça social.”.
As guerras representam, portanto, o desvirtuamento dos valores morais. São as guerras a personificação da transgressão ética. São a figura da degradação do verdadeiro endereço ontológico humano. São a expressão das sociedades voltadas para a competição, que nega a solidariedade e a colaboração.
Fazemos as guerras por ambições incomensuráveis, por distorção de nosso caráter ético, quando deixamos ou mesmo nutrimos o ódio, a ganância e a prepotência. Fazemos as guerras impelidos pela perversidade da lógica cruel e assassina que carregamos dentro de nós vindas de nossas ancestrais origens, repito, quando 
a agressividade se fazia necessária para a subsistência humana, as quais devem e precisam ser superadas. 
Fazemos as guerras por uma leitura de mundo distorcida que atrofia o desenvolvimento do potencial da grandeza humana.

c) Por que queremos a Paz? Por que precisamos da Paz?

Porque em nossa mais íntima e profunda humanidade existe e prevalece na maioria das pessoas do mundo o espírito da beleza e dos sonhos de construção de um mundo que ultrapassa os próprios limites humanos, exemplificados na mitologia grega de Ícaro, e, ultimamente no sonho utópico representado na Pomba da Paz, criada pela genialidade do pintor Picasso.
Precisamos da Paz por que ela nos abriga no conforto da Mãe-Terra, no útero aquecido do cuidado, da tranqüilidade, da VIDA. Precisamos da Paz por que ela garante a preservação do Planeta na sua multiculturalidade e diversidades de todas as naturezas e níveis.


d) A favor de que e de quem estão a Paz e a Guerra?


A Paz está a serviço de todos os seres do Planeta. As Guerras estão como sempre estiveram a serviço de poucos, dos donos do poder e dos que lucram com a fabricação e a distribuição dos utensílios e tecnologias de destruição das guerras. Infelizmente, as Guerras vêem sendo praticadas pelos fundamentalismos religio-sos, quer judaico, quer cristão, quer muçulmano-islamita; e pelos impérios econômicos atuais, que, sectariamente decidem os destinos não só das pessoas, mas do Planeta Terra.


e) Como obteremos a Paz? Como deve ser essa educação para a Paz?


A Paz só pode se instaurar como conseqüência de alguma educação crítico-conscientizadora, como a que Paulo propôs: “não creio em nenhum esforço chamado de educação para a Paz que, em lugar de desvelar o mundo das injustiças o torna opaco e tenta miopizar as suas vítimas.”, repetindo o que ele disse em Paris, 1986.
Fica claro que para Paulo a Paz não é um dado dado, um fato intrinsecamente humano comum a todos os povos, de quaisquer culturas. Precisamos desde a mais tenra idade formar as crianças na “Cultura da Paz”, que necessita desvelar e não esconder, com criticidade ética, as práticas sociais injustas, incentivando a colaboração, a tolerância com o diferente, o espírito de justiça e da solidariedade.
A Paz tem sua grande possibilidade de concretização através do diálogo freireano porque ele inscreveu na sua epistemologia crítica a intenção de atingi-la. O diálogo que busca o saber fazer a Paz na relação entre subjetividades. 
Em suma, para Paulo “A Paz se cria, se constrói na construção incessante da justiça social.”.
Justiça social que pode se fazer com a generosidade, a amorosidade e tolerância freireana. 
Sem fome, sem falta de hospital e saúde, sem falta de escolas e sem analfabetismo generalizado, sem falta de moradia e saneamento. Sem falta de comida e de entretenimento. Sem discriminações, sem elitismos, sem autoritarismo e sem a centralização.




REFERÊNCIAS




A pedagogia da libertação em Paulo Freire. São Paulo: Editora Unesp, 2001. (Série Paulo Freire)


Aprendendo com a própria história II. São Paulo: Paz e Terra, 2000, p. 84 a 86.

Educação para a paz segundo Paulo Freire.
Porto Alegre – RS, ano XXIX, n. 2 (59), p. 387 – 393, Maio/Ago. 2006

Estas são as categorias elegidas por mim para a análise da produção do analfabetismo no Brasil. Ver meu livro Analfabetismo no Brasil, 3a. edição, São Paulo: Editora Cortez, 2001.



"Educação Para a Paz: Uma Proposta Pedagógica Para a Não Violência

Educação para a Paz: uma proposta pedagógica para a não violência
Luiz Claudio Borin
Mestrando em Filosofia da Educação CE/UFSM. Especialista em Metodologia do Ensino Religioso (UPF) e Educação Sexual (UNIFRA). Professor de Filosofia e de Ensino Religioso do Colégio Franciscano Sant'Anna em Santa Maria - RS.


1. Resumo
2. Introdução
3. Problematização
4. Relato da proposta
5. A paz e o cotidiano escolar
6. Avaliação e rendimento
7. Considerações finais
8. Referência bibliográficas

1. Resumo

O presente artigo é feito com bases a um projeto que desenvolvi no Colégio Franciscano Sant'Anna, situado no município de Santa Maria, Rio Grande do Sul, com quatro turmas de educandos de sétima série, com idades entre doze e treze anos. O eixo principal é a problemática da Paz, onde os educandos em um primeiro momento fizeram leituras de recortes de jornais e ou revistas que evidenciam diversas formas de violência existentes em nossa sociedade e no mundo atual, tendo uma crítica a respeito das manchetes relatadas. Em seguida, foi realizada uma pesquisa escrita sobre a Declaração Universal dos Direitos Humanos e com exposição dos artigos mais relevantes. Para responder aos motivos que dificultam a execução da Declaração Universal dos Diretos Humanos, os educandos pesquisaram sobre a vida e a "causa" dos "heróis não violentos", como Mandela, Teresa de Calcutá, Betinho, Francisco de Assis, entre outros.



2. Introdução
O projeto "Educação Para a Paz: Uma Proposta Pedagógica Para a Não Violência" foi desenvolvido no Colégio Franciscano Sant'Anna, situado na cidade de Santa Maria, região centro do estado do Rio Grande do Sul. Esta Instituição Escolar tem uma excelente localização e busca adaptar-se dentro do físico que dispõe. É favorecida por estar situada em um grande pólo universitário, podendo, desta forma, garantir parcerias com a Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Universidade Franciscana (UNIFRA) e outras instituições de Ensino Superior.
A referida Instituição, possui quase dois mil alunos, aos quais oferece Educação Infantil (Maternal - Nível A - Nível B), Ensino Fundamental (Primeira à Oitava série), Ensino Médio (Primeira à Terceira série), Aproveitamento de Estudos e Magistério.
Porém, o projeto desenvolvido abrangeu quarto turmas de sétima séries do Ensino Fundamental, cujos interlocutores pertenciam numa faixa etária que variava de entre doze a treze anos.
Na minha prática educativa, percebo que uma das maiores problemáticas ocorre em torno da questão da agressividade, sendo esta intimamente ligada à violência social, que em grande parte, é perpassada pelos Meios de Comunicação Social (M.C.S.), principalmente a televisão. Desta forma, surge a importância de se trabalhar com os alunos de sétima série do Ensino Fundamental este assunto, a fim de construir uma prática pedagógica que promova uma mentalidade da cultura da não-violência.
Sem dúvida, o componente curricular Ensino Religioso Escolar (E.R.E.), possibilita reflexões críticas e construtivas a respeito desta problemática de relevância em nosso contexto histórico-social, existencial e transcendental, além de outras.
O Ensino Religioso Escolar no Colégio Franciscano Sant'Anna tem um papel muito importante e busca oportunizar ao educando condições para a descoberta da vida como Dom Supremo de Deus, despertando-o para o compromisso com o outro, na transformação da realidade através da vivência dos valores evangélico-franciscanos.
A proposta deste projeto de Educação Para a Paz é direcionar de maneira ordenada uma prática pedagógica com o objetivo de "possibilitar" erradicação toda forma de violência na comunidade educativa, buscando assim, uma paz social, impulsionando-os a reconstruir uma sociedade mais justa, solidária, tentando eliminar toda forma de exclusão e de opressão. Cabe ao "Educador da Paz", conceber um método de ensino que possibilite reflexões sobre a importância das resoluções de conflitos de modo não violento, incutindo uma nova concepção onde predomine a humildade e a tolerância.



3. Problematização
Hoje, o ser humano torna-se cada vez mais "individualista", com efeito, precisa-se, com urgência, torná-lo mais justo e em contrapartida, mais pacífico. Considerando a "Paz" como uma questão cultural, a escola possui um papel fundamental na construção dessa evidencia, assim como a violência que é perpassada de maneira clara e até mesmo "camuflada" pelos M.C.S.
Os M.C.S. através dos "heróis" que combatem a violência pela própria violência, dinamizam na criança e no adolescente que os assistem a mesma concepção de paz, ou seja, para conquistar a paz torna-se necessário armar-se, a "Pax Romana". O mesmo acontece nas escolas quando estuda ou ensina-se os "heróis", reforçando esta concepção, que para conquistar o que se deseja, deve-se armar, mesmo que seja em detrimento do ser humano.
Ao invés de estudar os "heróis" que perpassam a conquista da paz pela violência, por que não incutir nos educandos, pessoas que fizeram história através de seus testemunhos, como o grande Luter King, ou a coragem de Ghandi, o inovador Nélson Mandela, a bondosa Teresa de Calcutá, o carismático Betinho e a simplicidade de Francisco de Assis?
Verifica-se, portanto, que não só estamos em uma sociedade violenta, mas também, por uma ótica diferenciada, em uma estrutura educacional violenta e excludente. Desta forma, faz-se urgente proporcionar na escola a cultura da não violência, formando educandos com valores, atitudes e comportamentos que possibilitem uma Cultura da Paz.
As aulas partiram da realidade vivida pelos próprios alunos, tendo como base as suas experiências de vida e de mundo, não com conteúdos sistematizados e preestabelecidos, o que, certamente, desperta o interesse dos educandos em construir a proposta de uma Cultura de Paz.



4. Relato da Proposta
Como primeira reflexão, deteremos a questão da Justiça como um dos principais elementos da promoção da Paz.
Boff, deixa claro o conceito de Justiça, afirmando:
Justiça é dar a cada um o que lhe compete. Justiça é ter relação adequada à natureza de cada coisa. Justiça é, portanto, uma relação e uma atitude corretas, exigidas por cada situação". ( BOFF, 1999: 42 e 43 ).
Assim sendo, justiça é uma proposta não corretiva, mas de atos corretos, ou seja, dar a cada ser o que lhe é próprio, o que lhe é devido.
A sociedade na qual estamos vivendo é vitimada de muita violência que é, de certa forma, uma prática comum e até legitimada como algo inevitável no mundo moderno. Nunca se ouviu falar tanto em "Justiça" como nos últimos tempos, tendo como primeira concepção de resolução de problemas a questão da punição, sendo esta, considerada o meio mais eficaz, em uma visão utilitarista, para a obtenção da Paz.
Desta forma, a sociedade, de modo geral, aceita a "pena de morte" como a saída mais prática para combater as injustiças que perpassam o nosso cotidiano. Esse pensar imediatista para a solução dos problemas é comum, não só na sociedade, mas também em relação ao mundo escolar. O exemplo mais evidente é quando o educando sugere punições drásticas aos colegas que não seguiram as regras estabelecidas na escola, extrapolaram seus limites.
Em contrapartida, é necessário dinamizar nos educandos um modo de pensar e de agir que oportunize reflexões com a tentativa de buscar soluções que elimine as verdadeiras raízes do mal - a fome, a desigualdade social, a miséria. Logo, pode-se refletir com os educandos a melhor maneira de "combater" toda forma de violência e praticar uma "correta" Justiça Social. A paz só acontecerá em nosso mundo quando cada ser humano de maneira individual promover a Justiça no meio em que vive, mas, não haverá Paz enquanto tivermos injustiças social, conforme mencionado. Sendo assim, o profetismo de Isaías torna-se uma possibilidade viável: "E a obra da Justiça será a Paz; e o eleito da Justiça terá sossego e segurança para sempre." ( Is. 32,17 )
Com esse objetivo, desenvolvi o Projeto "Educação Para a Paz: Uma Proposta Pedagógica Para a Não-Violência" no Colégio Franciscano Sant'Anna, de Santa Maria - RS, com educandos das turmas de 7ª ( sétima séries ) e pude constatar que as reflexões feitas em sala de aula, dinamizaram nos mesmos uma forma diferente de entender a Justiça, não mais como um conjunto de leis, mas como uma Justiça fundamentada na fraternidade, no respeito incondicional a vida, principalmente as vidas abaladas por um sistema que oprime e exclui.
Eis aí a opção de fazer-se "pobre", de entender o sentido mais profundo da palavra "Misericórdia" (ter o coração do miserável), pois, somente quem sente o que o miserável vive e passa, pode "lutar" pela Justiça e obviamente pela Paz.
Responsabilizar o Estado, o Governo, os Meios de Comunicação Social e demais entidades, para a grave situação de violência que vivemos torna-se muito cômodo, porém, precisamos assumir a parcela de responsabilidade que cabe a cada um de nós e fazermos uma re-leitura de nossas práticas. Com efeito, tal momento histórico constitui um circunstância ímpar, devido a todos os acontecimentos violentos que estamos presenciando neste novo milênio que se inicia. Para isto, deve-se reiterar com os educandos o compromisso com a Vida em sua forma mais ampla e proporcionar uma reflexão a respeito da "Declaração Universal dos Direitos Humanos", de modo muito particular. É também um momento de imprimir no dia-a-dia valores como a Solidariedade, a Cordialidade, a Fraternidade, o Diálogo (no lar, na escola, no trabalho, no esporte, entre outros). Com isso, certamente, desarmar-se-á "espíritos" de agressividade e maldade.
A violência está fazendo parte de nossa vida, como se fosse um complemento de nosso corpo ou de nossa existência. Esta resulta em "abusos" de poderes: homens querendo ser mais do que as mulheres e vice-versa, pais em relação aos filhos, ricos em relação os pobres, educadores em relação aos educandos, intelectuais em relação aos ignorantes, todos vítimas de uma violência absurda, que não nos leva a lugar nenhum. Contudo, é claro e justo afirmar que são as nossas atitudes demonstrarão se somos contra ou a favor da violência enraizada nossa sociedade. Com este princípio, o educando refletirá seu modo de ser e de agir, tendo, portanto, um pensar conseqüente.
Não podemos de modo algum legitimar a violência em nossa vida, casa ou sociedade, afirmando que tudo que acontece "é normal", o que nos é, de certa forma, perpassado principalmente pelos Meios de Comunicação Social. Estes incutem na mentalidade dos seus telespectadores, um modo de pensar em que a violência é tratada de forma inevitável, influenciando também o pensamento, de forma quase geral de nossos adolescentes do Colégio Franciscano Sant'Anna e quem sabe, de todo sistema educacional nacional.
No trabalho realizado com recortes de jornais, se percebe a naturalidade com que os Meios de Comunicação Social perpassam a idéia da violência aos educandos e por conseguinte, o papel do professor é o de despertar o senso-crítico, fazendo com que os mesmos percebam que tais fatos não são "mera normalidade".
Deve-se com urgência incutir uma nova mentalidade, a da indignação frente as práticas violentas e a omissão, despertando um compromisso na reconstrução de uma civilização que tenha como princípio, a Justiça e a Paz.
Para a conquista da Paz, não devemos ficar em meros discursos, sem profundidade e sem compromissos. O primeiro pressuposto para a obtenção da Paz é possuí-la. Pessoas pacíficas irradiam a Paz, levam a Paz, têm a Paz.
Quem quiser ser instrumento da paz de Deus deve ele mesmo ser uma pessoa pacificada, imbuída de cuidado essencial e cheia do espírito de bem-aventuranças, que é o que traz a paz. Deve irradiar paz de dentro para fora a partir de sua identidade mais profunda. ( BOFF, 1999: 60,61 )
A Paz interior não implica tranqüilidade, mas uma relação harmônica entre o próprio ser, outros seres e os demais entes que os rodeiam. Tais relacionamentos devem manter no ser um equilíbrio, tornando-o pacífico diante dos acontecimentos, a fim de que resolva os conflitos de forma não violenta.
A sociedade, de modo geral, é marcada pelo individualismo, da mesma forma, esta "Paz" não implica em questões meramente pessoais, mas em questões amplas, pois, vivemos em "Comum-Unidade", em uma "Co-Existência" Fraterna, ou seja, somos parte de um Todo. Portanto, como podemos falar e ficar em "Paz", se em nossa sociedade temos "irmãos e irmãs" passando fome, vivendo em miséria absoluta, sem ter voz e nem vez? Ser pacífico não implica uma inércia ou indiferença social, é uma questão de "luta", que proporcione melhores relacionamentos e convivência entre todos os habitantes de nosso planeta.
Considerando este aspecto, foi trabalhado com os alunos de sétima série, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, tendo como objetivo central fazer com que os educandos percebam que para reconstruir uma nova sociedade, é fundamental a formação de uma civilização com Justiça, Igualdade e Paz e para isso, é imprescindível que a Humanidade redescubra o sentido da existência. Para esta conquista, é de suma importância o conhecimento e a prática deste "Documento Universal".
Mas, quais são os motivos que dificultam a execução da prática da Declaração Universal dos Direitos Humanos? Como tentativa de responder esta problemática, os alunos fizeram pesquisas em grupos sobre alguns homens e mulheres que fizeram a "Política da Não-Violência", como: Ghandi, Luter King, Mandela, Teresa de Calcutá, Betinho e Francisco de Assis.
A maioria das práticas violentas do Século XX foram ocasionadas pelo atual sistema (cultural - sócio político - econômico - valores - parâmetros que regem a nossa sociedade), portanto, precisa-se efetivamente proporcionar aos educandos reflexões acerca das ações de homens e mulheres que construíram um modelo possível através de um modo de pensar e agir mais humano e solidário.
Com este trabalho em forma de pesquisa, os educandos verificaram que existe e existiram pessoas que servem de um referencial positivo para a construção de uma sociedade onde predomine a Paz e o Bem. Pode-se dizer, que estas foram pessoas pacíficas, que souberam mais do que ninguém resolver seus problemas e mostrar a toda humanidade um modo não violento de resolver as dificuldades, incutindo assim, uma nova visão de Paz.
Para o desfecho deste trabalho foi proposto aos educandos a reflexão e análise de algumas frases, que serviram de alicerce para que pudessem expor suas idéias e entendimentos sobre o assunto. A dinâmica aconteceu da seguinte forma: o educador passou frase por frase no projetor e os educandos que concordavam com a afirmação da frase, ficavam em pé, enquanto que quem não concordava permaneciam sentados, justificando o motivo de ter concordado ou não com as devidas afirmações. As frases escolhidas foram essas:
  • "Quem quer Paz, prepare-se para a guerra."
  • "Onde há conflitos, não tem Paz."
  • "É preciso primeiro ter Paz interior."
  • "Luta e Paz se opõem."
  • "Pessoas agressivas não têm Paz."
Os educandos foram muito críticos perante este trabalho, não aceitando qualquer justificativa e respeitando o modo de pensar de cada colega. Com esta dinâmica trabalhamos os conceitos chaves para a reconstrução de uma sociedade com a perspectiva da Paz e do Bem.
A palavra "Paz" é "Sagrada", por isto, não se pode ficar apenas em símbolos vazios, que dizem pouco ou apenas uma parte da realidade, mas devemos entrar em sua dinâmica, fazendo com que o mesmo desperte algo em si, pois, assim, a Paz não ficará em meras palavras ou somente em belos símbolos, mas terá em seu bojo a verdadeira perspectiva.
É de suma importância que os educandos tenham claro certos conceitos para não cometerem equívocos não ficando no nível da superficialidade ou caírem no esvaziamento. Por isso, trabalhar de maneira correta conceitos como Paz, justiça, entre outros, é abordar questões de valores éticos e morais que norteiam nosso cotidiano.



5. A Paz e o Cotidiano Escolar
Em primeiro lugar, deve-se lembrar o tema ao qual consiste nosso estudo: "Educação Para a Paz: Uma Proposta Pedagógica Para a Não Violência". Como eixo central aparecem dois conceitos que nortearão esta pesquisa: Educação - Paz, e a seguir, Francisco de Assis, como eixo fundamental.
A palavra educação do latim, que significa "tirar de dentro", sendo assim, a educação perpassa a escolarização. Paulo Freire deixa claro que o educador e o educando aprendem juntos em uma relação dinâmica, tendo como método educativo a realidade no qual está vivenciando o educando.
Paulo Freire pensou que um método de educação construído em cima de uma idéia de diálogo entre educador e educando, onde há sempre partes de cada um no outro, não poderia começar com o educador trazendo pronto, do seu mundo, do seu saber, o seu método e material da fala dele. ( BRANDÃO, 1980: 21 )
Freire enfatiza a importância do diálogo para a construção do saber, pois "Dialogar é criar espaços para com que cada um possa dizer a sua palavra..." ( FREIRE, 1998: 38 ). Com isto, o educador reforça o conceito de educação e a mesma transcende a escola, conforme citado anteriormente.
Embora a educação seja permeada por pontos de vista divergentes, há um aspecto em comum: ela perpassa toda a existência humana e este processo determina, assimila e interioriza uma série de valores e atitudes no indivíduo.
Uma educação que proporciona a valorização do ser humano é uma educação "libertadora", sendo, portanto, um veículo de transformação da realidade social, impulsionando educador e educando à conquista de uma sociedade mais solidária.
Esta superação se faz realizando no cotidiano da escola, a educação libertadora, que é uma educação opcional, crítica, feita à luz da opção pelos pobres. Ela exige que, tendo como referencial ( inspiração e anúncio ) a sociedade solidária, existente, em germe, nas brechas do sistema, se recrie a escola, redefinindo a estrutura e a organização do trabalho escolar, de forma a possibilitar intervenções pedagógicas que se oponham ao que leva à exclusão. ( Caderno da AEC nº 72. 1998. Pág. 42 )
Dessa forma, a escola converte-se em um caminho que condiciona educadores e educandos a um compromisso de educar para a paz.
O primeiro passo para a obtenção da paz é a escola acabar com toda forma de exclusão. Logo constata-se que a paz é algo que se aprende, na família, na escola, na sociedade e meios de comunicação, além de outros. Cabe, portanto, aos educadores proporcionarem uma base ética aos educandos.
Uma educação para a paz pressupõe-se uma educação comprometida com a vida, em uma constante busca de respeito à dignidade humana, baseada na igualdade, na justiça e na fraternidade.
Trabalhar por um processo educativo que signifique contribuir para afastar o perigo da guerra; por um fim ao esbulho das zonas empobrecidas do planeta; ensinar a partir da e para a não-violência; aprender a considerar o conflito como um veículo de mudança, se sabermos resolvê-lo sem recorrer a violência; integrar o/a aluno/a em um processo de transformação da sociedade rumo à justiça... definitivamente, este vem a ser o compromisso de educar para a paz". ( Seminário de Educação para a Paz / APDH -CIP. 1990. Pág. 5)
Após a queda do muro de Berlim, viveu-se a expectativa de que o mundo conheceria a paz, pois acabara a "guerra fria". Contudo, com a globalização e logo a exclusão de muitos países do mercado, a esperada paz mundial, novamente foi adiada. Porém, não se pode passar aos educandos descrença, a visão que não se tem mais esperança, pois, existe em apologia da Paz a Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Embora, os meios de comunicação sociais reforcem a violência e nas escolas sejam estudados os "heróis" violentos, como Duque de Caxias, deve-se com urgência incutir nos educandos os "heróis da paz", como Nélson Mandela, Betinho, Teresa de Calcutá, Luter King, Ghandi, e Francisco de Assis, entre outros.
Mas, por que enfatizar como referência Francisco de Assis e não outro herói pacífico? Primeiramente, porque eu por ser professor de uma Instituição Franciscana penso ser mais do que justo o entusiasmo e a alegria em divulgar a idéia e as ações deste grande homem. E mais; em recente pesquisa, a revista norte-americana "Times" fez entre seus assinantes a seguinte questão: "Qual o personagem mais importante do milênio?" Para a surpresa de muitos aparece em primeiro lugar Francisco de Assis. Este, não era cientista, músico, presidente ou um general... mas era simplesmente "irmão de tudo e de todos". Contudo, isto faz com que Francisco continue vivo nas mentes e seu sonho torne-se realidade em nossa humanidade que não aprendeu ainda a lição do homem de Assis.
A grandeza de Francisco transcende ao cristianismo e ao mundo católico, este é um "patrimônio da humanidade". Com este espírito, líderes das grandes religiões reuniram-se, pela primeira vez, em Assis para uma jornada de diálogo, oração e pedido de paz para o mundo.
Era a primeira vez que homens de religiões diferentes se encontravam para rezar juntos e no mesmo lugar. O acontecimento mudou o curso da história das religiões. E nasceu um novo espírito, o 'Espírito de Assis'.
O "Parlamento das Religiões" em Chicago, em 1993, foi um dos frutos de Assis." ( KENDALL, Pág. 124 )
Assim, pode-se dizer, que o papel das religiões não é somente professar uma fé, mas que esta fé seja uma vivência e a construção de um mundo melhor para todos os habitantes, pois, se verificarmos os seus respectivos "fundadores", cada qual possuía esta mesma utopia.
Dir-se-ia que a fé não pode exprimir seu conteúdo nem ser vivida em sua realidade profunda, prescindindo do impacto com o mundo e do compromisso pela paz, pela justiça, pelos direitos humanos. ( CULTRERA, 1999. Pág. 168 )
Para que a paz torne-se possível, é preciso primeiro que se tenha a concepção de que cada ser é um irmão ou irmã, portanto, oriundos do mesmo Criador.
Pode dizer-se que São Francisco não amou a natureza, mas cada ser concreto. Não esquadrilhou a realidade de cada ser, como tentou fazer a ciência moderna. Foi além, a própria realidade de criatura, depende dum criador. ( SILVEIRA, 1994. Pág. 73 )
Esta dimensão de irmandade é vista por Francisco como um "Dom de Deus" e é o próprio Deus que lhe dá mais irmão, " o Senhor me deu irmãos" conforme testamento antes de sua morte.
Toda a vida, Francisco foi muito atencioso com os outros. E, embora o vejamos preferir a companhia dos mais humildes e abandonados, contudo está aberto a todos, mesmo os grandes desse mundo: vai ao Papa Inocêncio, torna-se amigo do cardeal Hugolino, atravessa o Mediterrâneo para levar a Boa-Nova ao sultão do Egito, a quem se impõe por sua grande polidez".( LECLERC, 1977. Pág. 176 )
Porém, reconhecer o outro como irmão exige uma atitude de diálogo, ou seja, ir ao encontro do irmão e desarmar-se, reconhecendo sua individualidade e o amando como realmente é. O amor é capaz de transformar a sociedade violenta em uma sociedade com os princípios da Cultura de Paz.
Aí reside a maravilha do amor: descobrir que a criação é um todo único, projetado por Deus que é Pai; e, se te apresentas como ele, desarmado e pleno de paz, a criação te reconhece e sorri para ti. ( CARRETTO, 1981. Pág. 163 )
A maior causa da violência social é decorrente de uma sociedade intransigente, sociedade que não aprendeu a amar e perdoar, que visa suas próprias conveniências e não busca comunicações possíveis.
Francisco lhe dá seu pleno sentido bíblico e evangélico. A paz que ele deseja a todos e a cada um é o favor de Deus, o perdão, a volta à graça, a amizade divina recuperada, numa palavra, a reconciliação total com Deus: e é por isso mesmo, também a reconciliação dos homens entre si e consigo mesmos, no mesmo espírito de misericórdia. Essa é a paz que Cristo veio trazer a terra." ( LECLERC, 1977. Pág. 177 )
Francisco buscava entender os problemas do outro e só através do diálogo e do perdão, procurava soluções viáveis às dificuldades.
É a lição deixada por Jesus. Ele estabeleceu o amor irrestrito ao próximo. Perguntaram-lhe: quem é o próximo? Em vez de dar uma resposta teórica, ele contou a história do bom samaritano. Daí se deriva claramente que o próximo é todo aquele de quem eu me aproximo, pouco importando sua condição social ou religiosa. Por isso depende de mim fazer dos outros inimigos próximos. ( BOFF, Pág. 39 )
Francisco, mais do que ninguém compreendeu os absurdos cometidos pela humanidade, por isso, levou uma vida baseada nos valores evangélicos. Desceu da categoria de rico e se encontrou na simplicidade da vida foi ao encontro dos excluídos, viveu um estilo de vida simples e reconstruiu um mundo de justiça, de Paz e Bem.
Toda pessoa, que dedica sua vida aos irmãos, necessita ser firme e ligada a um plano espiritual, a um Deus, a um ser superior. Este plano espiritual é que fortifica, que alimenta a pessoa, para que ela não se desanime com os entraves da luta, mas seja sempre perseverante. Este plano espiritual é contrário ao plano que o mundo ( ideologia capitalista ) oferece a você. Porque o mundo pede que a gente seja egoísta, que vivamos sempre pra satisfazer o nosso eu. A pessoa que entra nesta luta rompe com a ideologia do sistema, com os frutos da carne, com o pensamento do mundo. Mas isto não é fácil - gera muitos conflitos no interior da mente e muitos desistem. O que você pensa sobre isto? ( TRASFERETTI, 1999. Pág. 64 - 65 )
Fica, portanto, o desafio que Trasferetti propõe, não somente aos professores e educandos, mas a todos os seres humanos que querem e desejam viver em um mundo mais habitável, onde possamos viver como irmãs e irmãos. Então, está lançado o desafio.



6. Avaliação e Redimensionamento
Quando pensei na proposta de trabalhar este tema referente a Paz, muitas certezas estavam presentes, principalmente as que se referem as necessidades existenciais e sociais em que estamos passando neste mundo globalizado e neo-liberal, tendo o capitalismo como um sistema que não perpassa uma concepção de Paz que atinje a grande maioria da população, pois, o seu império é opressor e excludente para a grande parte das pessoas.
Diante deste paradigma, é evidente que trabalhar este projeto tornou-se uma necessidade nos dias atuais e no contexto escolar do Colégio Franciscano Sant'Anna, Instituição que se preocupa com tal problemática. Da mesma forma, os educandos demonstram receptividade pelo assunto.
Contudo, muitos desafios foram lançados e algumas dificuldades apareceram no decorrer do trabalho. Entre as principais dificuldades que encontrei perante os educandos, foi a de faze-los perceber, com questionamentos reflexivos, que somos atingidos pelo sistema global e neo-liberal e que se quisermos conquistar a Paz baseada na Justiça deveremos, antes de mais nada, refletir os aspectos positivos e negativos que o atual sistema sócio-político-econômico perpassa.
As reflexões feitas juntamente com as intervenções dinamizadas pelos educandos referentes à violência social, proporcionaram muita discussão em sala de aula, tendo diversos pontos de vista. Contudo, é relevante afirmar que os educandos constataram que se tivermos um modelo político-econômico-social justo, certamente alcançaremos a Paz o mais rápido possível.



7. Considerações Finais
Pode-se dizer que Francisco de Assis, Ghandi, Luter King, Teresa de Calcuta, Betinho, Mandela entre tantos outros, não foram "líderes" pacifistas, mas pessoas pacíficas, que compreenderam que as relações humanas transcendem a questões meramente materiais. Em todo o decorrer de suas existências, colocaram-se no lugar do outro, não analisando suas conveniências e seu próprio bem estar, mas o bem comum.
Estes homens e mulheres, são em nosso tempo e certamente, continuarão por muito, sendo modelos a serem seguidos, por todas as civilizações, para permear as relações humanas, incutindo uma mentalidade de Paz, contrapondo-se com a que é apresentada por ideologias dominantes.
Pode-se dizer que nossa sociedade, precisa com urgência, de homens e mulheres que acolham a proposta de Paz, e busquem constantemente o resgate de valores sadios e fundamentais para o futuro da humanidade.
Portanto, este projeto, é apenas o primeiro passo em uma longa caminhada para obter a "sonhada" Paz, porém, é preciso dar este passo para começar esta caminhada "Utópica e Possível". PAZ e BEM.



8. Referências Bibliográficas:
BRANDÃO, Carlos R. O Que é o Método Paulo Freire. Ed. Brasiliense 16ª edição, São Paulo, 1980.
---------- Revista de Educação AEC, nº 107/1998.
LINDOSO, Dirceu. Liberdade e Socialismo. Petrópolis, AMPM ed. com. de Livros, 1987.
---------- Caderno da AEC nº 72. Porto Alegre. 1998.
---------- Educar para a Paz, uma Proposta Possível; Seminário de Educação para a Paz / APDH -CIP. Madri - Espanha. 1990.
KENDALL, Margaret. Religiões em Diálogo. Ed. São Paulo, São Paulo. 1998.
CULTRERA, Francesco. Ética e Política. Ed. Paulinas, São Paulo. 1999.
SILVEIRA, Ildefonso. São Francisco de Assis e Nossa Irmã e Mãe Terra. Ed. Vozes Petrópolis. 1994.
LECLERC, Eloi. O Cântico das Criaturas ou Os Símbolos da União. Ed. Vozes, 2ª edição. Petrópolis. 1977.
BOFF, Leonardo. A Oração de São Francisco, Uma Mensagem de Paz para o Mundo Atual. Sextante, 3ª Edição. Rio de Janeiro. 1999.
TRASFERETTI, José Antônio. Ética da Misericórdia: Na Luta pela Sobrevivência. Ed. Vozes. Petrópolis. 1999.
CARRETTO, Carlos. Eu, Francisco. Ed. Paulus, 5ª edição. São Paulo. 1981.
RUPULO, Irani. Uma Proposta Educativa na Cosmovisão Franciscana para o Mundo Atual. Dissertação de Mestrado em Educação. FAFRA, Santa Maria. 1998.

Família, Educação e Paz

Bem-vindo à minha casa!
Raphaela Ferro

A escola é longe. Nágila Bianca Alves Mariano, 15, anda a pé um bom pedaço junto com seus irmãos gêmeos, de 7 anos, para chegar até lá. Nem por isso os alunos se sentem menos em casa quando estão nela.
Um dos motivos são as visitas que os professores do Educandário Espírita Eurípedes Barsanulfo, conveniado à rede municipal de Goiânia, fazem à residência de todos os alunos. Coordenadora da instituição, Raquel Lemos Martins explica que as visitas domiciliares fazem parte do programa da escola desde a sua fundação, há 27 anos.
Normalmente, elas acontecem uma vez por mês. Mas podem surgir de acordo com a necessidade dos alunos, como em casos de falecimento na família ou alteração no comportamento da criança, por exemplo. “Nosso objetivo lá é conhecer, nos aproximar mais dessa família, estabelecer esse vínculo de amizade, de coparticipação”, esclarece Raquel.
Assim, continua ela, a família passa a confiar mais na escola e o aluno se sente valorizado. Nágila confirma. “É bom ver que eles se interessam por como eu estou, pela minha vida e queiram participar dela.”
A prática antiga no educandário pode se tornar novidade em todas as escolas públicas do país. No início de fevereiro, o ministro da Educação, Aloizio Mercadante, anunciou que pretende implantar um projeto semelhante na rede pública.
Confusões à domicílio
Diretora da instituição espírita, Rita Ferreira afirma que acredita na relevância da iniciativa, caso venha a ser implantada. “Esta atividade ampliaria o olhar do educador sobre a problemática social na qual os alunos estão envolvidos, podendo facilitar o planejamento pedagógico com ações que repercutam de fato na vida familiar e comunitária de nossos alunos, além dos muros da escola”, avalia.
Entretanto, algumas ressalvas devem ser consideradas. Rita enfatiza que é preciso ter cuidado para que os papéis da família e da escola não se confundam. “Fortalecer a família não é assumir o seu papel, mas orientá-la e ouvir de mais perto as suas expectativas quanto à escolarização de seus filhos.” Há ainda um risco maior: a confusão sobre até onde vai a responsabilidade do professor.
Com pós-doutorado em Educação, o professor da Universidade Federal de Goiás (UFG), João Ferreira de Oliveira lembra que os professores, normalmente, têm uma jornada de trabalho extenuante e já levam uma série de trabalhos para casa.
Nesse contexto, é complicado imaginar, mesmo com remuneração extra, que eles tenham condições de fazer visitas aos alunos. “Há muitos problemas sociais envolvidos que não são responsabilidade do professor. É preciso incluir assistentes sociais, psicólogos e agentes de saúde que atuem orientados pela escola”, considera Oliveira.
Proposta exigente
As visitas domiciliares seriam úteis como serviço feito por esses profissionais, sem atrapalhar os professores no exercício de sua atividade principal: o processo de ensino-aprendizagem. Rita concorda que é necessário o envolvimento de outras áreas.
Ela aponta que o projeto nacional deflagraria uma série de ações que exigiriam do poder público um real apoio à atividade educacional. “Inúmeras necessidades são descobertas nessas visitas, o que traz ao educador um sentimento de impotência”, resume a diretora.
Situação vivenciada no educandário. Raquel conta que a escola se sente sozinha, porque precisa do apoio de outras áreas e não tem, como nos casos em que a família precisa de atendimento psicológico ou mesmo passa fome. “Tem esse sentimento de impotência. Como eu vou conseguir fazer qualquer intervenção para mudar o quadro? Não é uma coisa fácil.”
Para Rita, tornar a proposta nacional forçaria as escolas a terem um planejamento educacional mais amplo e exigiria ações conjuntas constantes entre saúde, assistência social, segurança etc.. O funcionamento dessa proposta depende de muitas condições.
O alerta é da coordenadora técnica do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec), Maria Amábile Mansutti. “Fazer o professor assumir esse trabalho de estreitar vínculos com a família implica recursos financeiros e organização do quadro docente da escola”, informa.
Segundo ela, essas garantias são necessárias porque, caso o projeto não esteja bem organizado, há o risco de sobrecarregar o professor. Amábile explica que, para dar certo, o ideal é que o professor que assuma essa função esteja vinculado a uma única escola.
Mas as visitas não podem ser confundidas com ações de assistência social. Ela enfatiza que a proposta precisa estar muito bem concretizada para não ser interpretada de forma equívoca e para que realmente sirva como facilitador do trabalho na escola.
A coordenadora aponta alguns objetivos possíveis para a prática. “O professor pode identificar possíveis causas de dificuldade de aprendizagem dos alunos, pode esclarecer os pais sobres as estratégias e metodologias que a escola adota. É importante que ele compreenda as condições de vida da família, para ajudar o aluno a melhorar seu desempenho”.

Deu certo em Taboão da Serra
O ministro Aloizio Mercadante anunciou que vai lançar projeto que leve os professores a visitarem a casa de seus alu­nos. Por enquanto, o MEC (Mini­sté­rio da Educação) ainda não se pronuncia oficialmente sobre o assunto.
A base dessa proposta é uma iniciativa do município paulista Taboão da Serra, lançada em 2005, quando o atual secretário da Educação Básica do ministério, César Callegari, era secretário municipal.
Trata-se do Programa Interação Família-Escola, coordenado pela supervisora de ensino Roberta Bellinato.
Ela explica que os objetivos do projeto eram melhorar a qualidade da Educação, aproximar as famílias da escolas, integrar as instituições à comunidade, desenvolver redes de proteção social, além da formação continuada dos professores e metodologias de pesquisa.
Deu certo! Roberta conta que o programa serviu como instrumento de reflexão da prática pedagógica, aproximou as famílias da escola e os alunos dos professores.
Maria Amábile Mansutti, coordenadora técnica do Cenpec, lembra que o impacto da iniciativa foi conferido no Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica).
Cautela
Para ela, os resultados foram bem positivos, porque houve organização da secretaria local. O programa foi considerado um dos mais estruturados enquanto política pública na questão de interação entre fa­mí­lia e escola com sentido pedagógico pela Organização das Nações Uni­das para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).
Mesmo assim, a oficial de programas em Educação da entidade, Marilza Regattieri, admite que para ser replicada a proposta precisa ser ampla.
“A visita do professor é um instrumento que deve existir dentro de uma política mais articulada, ampliada. Só a visita, por si só, não vai apresentar resultados, não pode ser mais uma tarefa para o professor”, considera.
Para Marilza, uma ação como essa deve ser parte de uma política pública maior que envolva toda a rede de proteção social disponível no município.
Função da escola? Sim! “Drogas, depressão, violência familiar e outros problemas estão aí e afetam o aprendizado. Independente de se o professor vai até o contexto do aluno ou não vai, essa realidade vai estar presente na escola”, aponta a oficial da Unesco.
Marilza, Amábile e João de Oliveira concordam que é preciso aproximar a escola da realidade do aluno e de sua família, mas a forma como isso será proposto ainda deve ser muito discutida.
Para ele, os temas extraescolares devem ser resolvidos com a participação da escola, mas de maneira extraescolar, com profissionais aptos de outras áreas.
Marilza e Amábile acreditam que as visitas podem ser positivas, mas permanece a ressalva. “Para dar certo vai depender de uma série de condições: de ter proposta bem delineada e de convencer e formar os professores para que eles possam desenvolver essa função”, completa Amábile.
Fonte: http://www.tribunadoplanalto.com.br/escola/13982-bem-vindo-a-minha-casa